quarta-feira, 5 de março de 2008

Sonho lúcido em terceira pessoa e falso despertar

Nesta madrudaga do dia 05/03/2008 tive um novo sonho lúcido. Para que se possa compreender seu significado e a complexidade da (meta) narrativa, é interessante dizer algo sobre o contexto da noite, nos momentos que antecederam o sono propriamente dito.
Duas noites antes do sonho, em meditação, percebi que uma boa "purificação" e aumento de lucidez seriam alcançados por meio da associação entre o estado de "fluxo caótico inconsciente" - obtido no estado hipnagógico - e aquela meditação em que se cria o observador - "Shamata". Assim, estendendo-se o estado hipnagógico ao máximo e conservando-se pelo menos um mínimo de lucidez, podemos estabelecer um contato intenso com tudo aquilo que nos seduz, nos perturba e nos desestabiliza - justamente a matéria prima dos sonhos em geral. Ora, parece-me que o que impede a lucidez onírica é exatamente essa perturbação íntima, pois nos sonhos vivenciamos com intensidade tudo aquilo que "nos afeta" intimamente. Esse estado de "perturbação" e desequilíbrio tem sua gênese exatamente no estado hipnagógico.
A idéia é, assim, "caçar Carmas" utilizando-se os sonhos: ao começarmos a ser hipnotizados e desestabilizados, acionamos a meditação, por meio da lembrança e da vivência da própria mente (criação do observador). Esse método tem outra vantagem, pois no estado hipnagógico, a frequência cerebral já se encontra alterada, o que nos possibilita uma meditação extremamente poderosa.
Em outras palavras (reproduzo minhas anotações da noite em que essas idéias emergiram):

"deve-se procurar o estado mais hipnótico e sedutor possível e, nesse momento - antes de o sonho acabar de se formar - acionar a mente meditativa. O estado mais hipnótico deve ser buscado por meio da imaginação e pensamentos que promovam maior envolvimento possível, a busca da ilusão e da sedução, acionando-se a inconsciência (caça ao Carma...). Porém, esse processo deve ser acompanhado de uma prática constante de Shamata que nos leve a um poderoso observador (por exemplo: prática diária de meditação focada na respiração e meditação da presença...)."
Posteriormente, vejo que há uma relação entre a proposição acima e a perspectiva budista em relação aos sonhos lúcidos. Como se sabe, esta propõe que acionemos a energia feminina primeiramente para, em seguida, acionar a masculina. (vide para mais detalhes o texto "A Buddhist Perspective on Lucid Dreaming).

Pois bem: na noite seguinte, dia 04/03/2008, não obstante me encontrar bastante cansado, tentei praticar um pouco de meditação focada na respiração. Entretanto, dado que estava exausto, a prática não se prolongou muito, apenas 10 ou 15 minutos. Resolvi então interromper e me entregar ao sono, sabendo que isso me levaria logo ao SONHO. Contudo, procurei, apesar do cansaço, observar o estado hipnagógico se formando...
Algo peculiar, entretanto, aconteceu, pois o sono não chegou tão rapidamente quanto esperava e, ao contrário, percebi que me encontrava particularmente imbuído pela sensação de "vacuidade" das coisas. É como se o "observador" fortalecido pelas práticas das noites anteriores - por meio da meditação - estivesse bem atento e "energizado", ainda que eu me encontrasse fisicamente fatigado e com sono. Esse "observador" não se entregava facilmente à seduçao e não se deixava desestabilizar pelo estado hipnagógico. Bastante tempo fiquei nesse estado e me ocorreu que isso seria propício para a obtenção da lucidez onírica.
Finalmente adormeci.
No meio da noite acordei, após ter tido o sonho que se segue (a descrição é algo confusa, pois, como ficará explícito, o sonho lúcido não foi o último sonho e a lembrança dos detalhes ficou apagada...).
Duas pessoas conversam sobre morte - é um sonho em terceira pessoa. Alguém fala que uma mulher solteira e rica estava para morrer sem aproveitar a vida. Nesse momento, um dos interlocutores - que parece que vai se tornando "Eu mesmo" - pensa:
"- Coitada, pelo menos se ela tivesse sonhos lúcidos poderia aproveitar a vida." - E essa pessoa, que agora sou eu, imagina como seria a mulher tendo sonhos lúcidos e, assim, essa imaginação se converte, no sonho, na própria cena em que Eu estou tendo o sonho lúcido.
O diálogo inicial, em que Eu estava ausente e se desenrrolava em terceira pessoa, converte-se em primeira pessoa, e agora sou eu mesmo que estou sonhando lucidamente ! (como se eu me convertesse na mulher que o interlocutor imaginou tendo sonhos lúcidos).
Interpretando agora essa passagem, é possível que a "mulher que está para morrer sem aproveitar a vida salvo através dos sonhos lúcidos" seja uma referência à perspectiva feminina da própria mente. Se essa interpretação estiver correta, talvez o que o sonho esteja propondo é que os sonhos lúcidos constituem uma excelente via para a parte intuitiva-receptiva da mente viver e entrar em ação !
Agora sonhando lucidamente, estou em uma sala, à noite, com uma grande janela (ou varanda) à minha frente. Como sempre, resolvo voar, muito alto, e vejo toda a cidade iluminada bem abaixo de mim, onde 2 grandes edifícios (blocos retangulares) se destacam. Edifícios envidraçados, com muitas janelas iluminadas.
No meio do vôo penso: é isso que está faltando para as pessoas: terem uma visão panorâmica de suas vidas e de seus problemas, pois cada edifício deste sonho são como fatos importantes ou problemas significativos. Percebo que estou RACIONALIZANDO e o sonho começa ficar turvo. Mas logo afasto esse pensamento e simplesmente vôo sobre a cidade.
Não me lembro bem, acho que pouso em algum lugar, mas não sei o que ocorre em seguida, pois depois HÁ UM FALSO DESPERTAR.
De fato, "acordo" muito excitado e conto meu sonho lúcido para alguém, com todos os detalhes acima, inclusive estabelecendo algumas relações com a meditação etc. Ou seja, durante o "relato onírico" do sonho lúcido, eu atribuo este último à vivência (real) ocorrida antes de dormir.
Digo mais ou menos assim:
"- Cara, eu tinha CERTEZA, CERTEZA ABSOLUTA que iria ter sonhos lúcidos esta noite. Eu estava muito energizado e meus pensamentos não se convertiam em sedução, ao contrário, eu estava muito "consciente da vacuidade" de tudo. Se eu descobrir o mecanismo do sonho lúcido, vou escrever um livro que vai abalar as estruturas."
Minha interpretação aqui é de que o sonho mostrou que a minha ansiedade em obter lucidez onírica é, ela própria, prejudicial à obtenção desta mesma lucidez. Ou seja, o "falso despertar" e a excitação, ainda em sonho, demonstrada na narrativa do sonho lúcido, mostram que essa excitação e ansiedade redundam em um novo sonho - e em um novo mergulho na sedução e na perturbação !
Em seguida - creio que estamos em um Shopping Center ou algo assim. Rumamos para a saída do edifício, mas ao invés de tomar o elevador, escorregamos por meio de canos (tal como o Batman fazia !! - rsrs).
Chegando na garagem subterrânea, penso:
"- Este método de descer é bem eficiente, só que dá direto no subsolo !".
Minha interpretação aqui é de que o sonho fez uma referência ao "atalho" para o inconsciente e as "instâncias subterrâneas da mente" - ou seja, fez referência à associação do estado hipnagógico com a meditação, assim como os próprios sonhos lúcidos já descritos cima.
Então, temos que sair da garagem subterrânea para o térreo. Porém, ainda estou muito excitado com o sonho lúcido e até comento:
"- Foi bem perigoso ter feito a metáfora no sonho entre a vida e a paisagem, pois quase acordo !"
Foi aqui que acordo de fato, em razão de um ruído externo.

3 comentários:

Jornalixo disse...

Muito legal suas reflexões. Vou me concentrar na minha respiração essa noite.
Não sei se estou enchendo o saco, mas tive meu 3 sonho com meu mestre interior. Acho que vou parar de fazer isso, pois meio que me induzi a pensar que seriam encontros estranhos, como da última vez. Qqer coisa, postei no mesmo tópico antigo.
Abraço e sucesso no blog (sempre entro aqui pra ver se tem coisa nova)

tadeu andrade disse...

há bastante tempo tenho experiências que se assemelham às que são relatadas neste blog. Prefiro não dar nomes a elas. As experiêncis que tive, até hoje, foram espontâneas, não necessitaram de mestres e não demandaram referências místicas.
Gostaria, porém, de obter outras referências e fontes sérias sobre este assunto, além deste blog - místicas ou não.

jholland disse...

Ol'a Tadeu,

Muito obrigado por acompanhar e participar do Blog. (perdoe pela falta de acentuacao...)
Destacarei algumas referencias, comecando com as mais basicas e introdutorias:
1)como introducao, recomendo o livro de Steve LaBerge, "Sonhos Lucidos", facilmente encontravel em sebos ou em formato digital, como EBook. Esse livro tem uma abordagem cientifica, porem bem aberta. Outra obra introdutoria: Sonhos Criativos de Patricia Garfield - livro mais antigo e mais dificil de achar;
2) como abordagem bem mais aprofundada, recomendo a leitura e/ou pratica em torno dos termos Ioga dos Sonhos (de inspiracao budista tibetana) e Ioga Nidra - esta ultima busca a manutencao ou o despertar de uma consciencia nos estados de sono profundo. Aqui neste Blog voce podera encontrar um texto introdutorio acerca da Ioga Nidra que reputo bastante bom. Voce podera encontar algum material sobre esses assuntos na Internet e em livros, porem a maioria eh importada (podem ser adquiridos pela Amazon, por ex.);
3) outra abordagem, encontra-se nos livros de Carlos Castaneda, em especial seu ultimo livro, A Arte do Sonhar - devo dizer que este autor eh muitissimo controverso, porem nesse livro voce podera encontrar algumas tecnicas interessantes;
4) Um texto muito importante (em ingles) encontra-se neste Blog: "Uma perspectiva Budista sobre Sonhos Lucidos" - recomendo fortemente sua leitura, caso voce busque maior aprofundamento.
4) De resto, creio que os muitos textos e links contidos neste Blog, alem das discussoes que temos travado (nos comentarios `as postagens) poderao lhe servir de excelente material.

Caso eu me lembre de mais alguma coisa, vou passando...

O mais importante porem eh a pratica !

Fique `a vontade para trocar ideias e experiencias.

Abs !